08 setembro 2015

{Resenha} Os Três - Sarah Lotz


Eles estão aqui. Eu... Não deixe a Snookie comer chocolate, é veneno para os cachorros, ela vai implorar a você... O menino. O menino, vigiem o menino, vigiem as pessoas mortas, ah, meu Deus, elas são tantas... Estão vindo me pegar agora. Vamos todos embora logo. Todos nós. Tchau, Joanie, adorei a bolsa, tchau, Joanie, pastor Len, avise a eles que o menino, não é para ele...

Sobre o que é: Quatro aviões caem no mesmo dia em partes distintas do planeta, aparentemente sem nenhuma relação de causa. Três crianças são os únicos sobreviventes dos acidentes, mas, em um deles, uma mulher chamada Pamela May Donald vive o suficiente para deixar uma estranha mensagem gravada no telefone, dirigida ao pastor de sua congregação. A partir dai o mundo se enche de teorias da conspiração e histeria religiosa, culminando em caos e tragédia.


O que esperar: Um livro dentro de um livro. A maior parte de Os Três - as exceções são os primeiro e último capítulos, que têm uma narrativa normal em terceira pessoa - é escrito na forma de vários relatos, entrevistas, emails, diálogos de chat e artigos de jornal, reunidos por uma "ghost writer"  fictícia chamada Elspeth Martins, que os está organizando em um livro sobre o dia que ficou conhecido como Quinta-Feira Negra, os acidentes e suas consequências. Várias testemunhas, entre membros das equipes de resgate, testemunhas e parentes das vítimas, dão seus relatos no livro, muitas vezes contraditórios. Apesar de ser um livro de ficção, é importante que o leitor esqueça isso um pouco e tente lembrar que há uma manipulação por trás do material reunido. A maioria dos depoimentos não é confiável e pede um olhar crítico, apesar do nível de credibilidade nunca ficar inteiramente óbvio.


Opinião: Quase deixei esse livro passar porque, a primeira vista, tive a impressão de que o ponto de vista dos personagens fanáticos religiosos dominava a narrativa e esse é um tema que não me agrada muito. Foi uma felicidade ter dado a Os Três o benefício da dúvida, porque ele se mostrou um livro bem escrito, com um enredo interessante, difícil de largar.

Os relatos do livro são coletados nas quatro partes do mundo onde os acidentes aéreos aconteceram: Estados Unidos, Inglaterra, Japão e África do Sul. De cada um dos três primeiros acidentes, uma criança sobreviveu quase ilesa, mas passando a apresentar uma mudança de personalidade radical. Os relatos mais impressionantes são aqueles acompanhando o que aconteceu às três crianças e àqueles envolvendo o Pastor Len, o pregador para quem a mensagem de Pamela foi dirigida, e que se aproveitou da situação para elevar seu status entre os fieis, criando uma seita que pregava o início do final dos tempos e a ideia de que as crianças sobreviventes teriam sido possuídas pelos quatro cavaleiros do apocalipse – inclusive iniciando uma busca por uma suposta quarta criança que causa boa dose de problemas. Com o apoio de um famoso líder religioso e um escritor de ficção com temática religiosa, ambos igualmente mercenários, suas palavras ganham alcance mundial, causando pânico e histeria por todas as partes. O Pastor Len eventualmente é passado para trás pelos colegas mais famosos, o que inicia uma cadeia de acontecimentos que leva ao clímax do livro (nesse caso me refiro ao livro de Elspeth). As partes envolvendo religião são frequentes, mas Elspeth Martins - ou seria a própria Sarah Lotz? - dá a elas certo tom de exagero que torna difícil leva-las a sério. 

Lotz foi competente em, mesmo fazendo uso de um formato diferente de narrativa, criar bons personagens, alguns bem sinistros, outros dignos de compaixão. Também é importante mencionar, que esse não é um livro de horror, embora algumas passagens soem sim, assustadoras. Talvez dependa da experiência prévia do leitor com autores de horror e ficção científica.

O único ponto negativo que aponto é que, após terminar a leitura, fiquei com aquele sentimento de que a autora tinha colocado um pé no meio do caminho e me feito cair de cara no chão. Ao contrário do que eu geralmente prefiro em livros, que é um final mais fechado, fiquei decepcionada por este não ter mantido a ambiguidade que senti ao longo da narrativa. Os depoimentos sempre me deram a sensação de que, dependendo da forma como eu escolhesse ver as coisas, o mistério do livro poderia ser perfeitamente explicado tanto como tendo causas sobrenaturais, como sendo fruto de histeria coletiva. O final me deu um banho de água gelada com uma explicação fechada, mas insatisfatória.

Os Três me lembra outro livro: Sob a Redoma, do Stephen King; no sentido em que ambos tratam das consequências de um acontecimento inexplicável, com a diferença que o livro de Sarah Lotz aborda isso a um nível global enquanto King lidava principalmente com pessoas no espaço limitado de uma cidadezinha. O que quero dizer é que, diante da grandiosidade dos efeitos do evento inicial, o mesmo acaba se tornando um coadjuvante a ponto de uma explicação não parecer tão imprescindível. Lembrando que em Sob a Redoma, a descoberta do que estava acontecendo foi importante na resolução do conflito, enquanto em Os Três, não fez nenhuma diferença e ainda fez com que perdesse aquela ambivalência que estava funcionando tão bem.

Independente da minha opinião sobre o final, eu não só recomendo o livro como estou ansiosa para ler a sequência, intitulada Day Four, ainda sem tradução no Brasil.




Avaliação:




Serviço
Título Original: The Three
Editora: Arqueiro 
Ano: 2014 
Número de Páginas: 400

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